sexta-feira, 6 de junho de 2014

[Copa-Comentários] #DeveTerCopa e #DeveTerManifestações

Faz algum tempo que pretendia escrever sobre o #NãoVaiTerCopa X #VaiTerCopa. Tanto tempo que a primeira opção virou #VaiTerLutaNaCopa. A minha ideia era contrapor os argumentos, pescando as opiniões de ambos os lados para mostrar que o Brasil não é só azul e vermelho, dualidade cartesiana que muito vem me incomodando - vide último texto -, ainda que neste ponto a querela pudesse ser vista entre governistas e movimentos/partidos de esquerda.

O fato gerador do que seria aquele comentário foi um vídeo exibido no telejornal da TV dos Trabalhadores produzido pela TV Vermelho, ligada ao PCdoB, que apontava todos os motivos para que a Copa existisse. Além disso, até por conta da minha trajetória, recebo convites sobre protestos e eventos relacionados à Copa.

Por conta de (falta de) tempo, não pude fazer o texto e nem poderei fazê-lo, então aproveitarei um comentário no Facebook para destrinchar os pontos que elenquei naquele contexto, que explicarei a seguir. Antes disso, deixo links de dois textos que eu tinha separado para a discussão que vejo como essenciais para entendimento do meu ponto de vista.

O primeiro é de janeiro de 2012, relativo a uma discussão sobre a Copa que participei numa rádio comunitária de Porto Alegre: http://terrainteressados.blogspot.com.br/2012/01/por-tras-do-gol-quem-ganha-com-copa.html. O segundo foi publicado no Observatório da Imprensa, é de fevereiro de 2013 e trata da opinião de Ronaldo Nazário sobre as cobranças da imprensa sobre o evento - muito antes de ele assumir o apoio à candidatura de Aécio Neves. Os dois são de antes da grande articulação de junho do ano passado, onde até então as discussões contra a Copa eram descentralizadas por movimentos sociais que sofriam diretamente das ações das obras para ela.


Tentando contextualizar, no post que comentei, o autor diz não entender o porquê de as pessoas torcerem contra a Seleção Brasileira e que a Copa do Mundo seja um fracasso colossal. O início do comentário se refere a um tempo dicotômico, citado por outra pessoa, que questiona como chegamos ao ponto de só termos praticamente 'duas possibilidades de regime" num país tão miscigenado.

Sou fascinado por futebol, além de gostar muito de quaisquer outras formas de disputa esportiva, o que nunca me fez deixar de olhar de maneira analítica e crítica sobre este. Porém, reduzi-lo ao caráter mercadológico não explica o fenômeno mundial que se tornou e ainda é o futebol. Se ele fosse tão passível de controle e direcionamento, não teria tanto público e, consequentemente, atratividade para girar rodas de fortunas pelo mundo nos mais diversos setores econômicos.

Pensar como o "ópio do povo" somente é acreditar num discurso equivocado de que as pessoas não respondem àquilo que "recebem", que o futebol as fazem esquecer das mazelas do dia a dia, acomodando-as. Como se o Brasil só pudesse crescer no dia em que o futebol não seja a sua maior paixão, como li por aí. Um absurdo se considerarmos que, na realidade, o futebol não tem pátria. Então, ele tem seguidores em países de distintos aspectos culturais e socioeconômicos. Fora isso, é bem mais fácil ver alguém reclamando da gestão do seu clube, apontando o dedo contra o dirigente no estádio, que com político - por mais que no momento positivo também se exalte o dirigente como um deus.

Uma pessoa comentou após o meu comentário que não via nada de estranho gostar de futebol e criticar as relações em torno dele. Não foi o meu caso, ao menos não diretamente, mas na Copa das Confederações do ano passado li um relato também no Facebook de alguém que teria sido constrangido por torcer pelo Brasil dos campos em meio às manifestações.

#DEVETERCOPA

Não concordando com a Joana Havelange, que "o que foi roubado já foi", não fazia sentido ter gasto tanto com a Copa e impedir que ela aconteça. Imagina destruir o metrô de Salvador, há anos para ficar pronto, por conta de supostos superfaturamento e desvio de recursos durante o período. É jogar mais dinheiro pelo ralo.

Aproprio-me há algum tempo de uma ideia de um amigo, sabemos que tal dinheiro não seria gasto com escolas, hospitais e etc. O orçamento brasileiro tem como prioridade o pagamento dos juros da dívida, com recursos sendo desviados para garantir as condições de mercado, ainda que nos casos destes governos de coalizão comandados pelo PT tenha havido certo controle sobre determinados preços de produtos - caso dos combustíveis, gerando problemas para a Petrobras; do IPI de determinados produtos etc. - cujo benefício também chega ao consumidor final, para além de manter o consumo girando e, consequentemente, as empresas faturando.

A Copa poderia gerar a possibilidade de investimento em infraestrutura, que não estava nos tais encargos da FIFA, mas cujas obras pouco se concluíram a tempo, muitas das quais sequer saíram do papel. Hospitais ou escolas? As obras são para mobilidade, seja novas pontes, novas estradas ou reformas em aeroportos - com cessão em alguns casos para a iniciativa privada (privatização?), assim como no caso de alguns estádios, caso do Maracanã.

Ninguém questionou o Brasil como sede única em 2007 e poucos lembram disso, mesmo a FIFA. Foi a tentativa de rodízio por continentes se encerrando na América do Sul. A Argentina se candidataria, mas desistiu, até mesmo pela força do então presidente da CBF na entidade na época. Além do momento econômico nosso ser melhor e mais garantidor que o dos argentinos. É bem diferente do que ocorreu com as escolhas de Rússia e Catar, em que havia candidatos fortes competindo. A FIFA sabia que a Copa seria no Brasil porque seria difícil imaginar um mundial de futebol em outro país sul-americano no tal esquema de rodízio.

Mas ninguém reclamou. Isso que todxs ouvimos falarem que não seria gasto um centavo de dinheiro público para poucos anos depois confirmamos, nós, "pessimistas" de sempre, que a maioria dos recursos viriam dos cofres públicos, entre União, Estados e municípios. Vínhamos de um Pan-Americano a toque de caixa, sob a desculpa de ter havido transição de governo - algo que a FIFA reclama hoje, mesmo sendo mudança de nomes, não de partidos.

O Pan gastou muito mais que se programou, tirou pessoas de suas moradias, construiu não um elefante branco mas um Engenhão (sob alcunha de Estádio João Havelange) que não durou 5 anos e teve forte repressão policial às comunidades do Rio de Janeiro. Mas houve poucos argumentos contrários.

Assim como ocorreu com a escolha do Rio como sede olímpica. Para piorar, desenha-se um processo parecido com o do Pan. Faltando dois anos, está tudo muito atrasado e é (bem) provável que tudo seja feito a toque de caixa, porém, poucos estão de olho nisso e há tempo, e informações midiáticas inclusive, para observar o caso.

#DEVEMTERMANIFESTAÇÕES

Que os protestos continuem na Copa e para além dela. Por mais que eu não tenha percebido que partidos/movimentos sociais tenham aproveitado as manifestações do ano passado para dar seu recado, talvez por não compreenderem a sociedade contemporânea e ficarem presos a certas maneiras de atuar, e que o movimento seja tão forte quanto no ano passado, é importante delimitar o espaço e aproveitar a visibilidade do momento. Porém, como estes movimentos e partidos sabem muito tempo, luta se faz todo dia. Não faltam contradições sociais para combater e não faltarão. Mas falta saber dialogar com a sociedade, tirar da opacidade os discursos, ainda que sem esvaziá-lo na prática política, como vemos nos últimos anos com o que era a referência da esquerda brasileira (e que era na América do Sul como o maior partido dela no subcontinente).

Entender que o futebol é mais um elemento cultural utilizado para produzir mercadorias, não o único, não o culpado pelas mazelas gerais da nação. Algo que reflete à sua maneira, talvez uma difração, as contradições sociais e vícios de oligarcas políticos no país - sempre digo que é ainda pior, pois é algo de desenvolvimento organizacional atrasado no país, o espaço em que capital estrangeiro não entra nem a pau e que certos preconceitos podem virar lugar comum em forma de xingamentos.

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