sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

[Circo a motor] Dinheiro

Em meio à minha última melhor performance escrevendo para o blog, com direito a análises após cada corrida da Fórmula 1, um dos meus maiores e melhores leitores, o então colega da graduação Bruno Martins chegou a me perguntar sobre um livro de jornalismo esportivo que desdenhava do caráter esportivo dos esportes a motor. 

Na época fiquei na dúvida. Além de não ter lido o livro, também não tinha fortes argumentos para defender, enquanto assíduo telespectador das corridas, a Fórmula 1, em especial, como algo que possa ser comparado com vôlei, luta olímpica, futebol ou qualquer outra coisa.

Pois bem, a volta da coluna a este blog foi com um texto sobre a aposentadoria de Rubens Barrichello da categoria. Nele, comentava que o dinheiro pesou muito mais na escolha de Bruno Senna pela equipe Williams F1. Mais um sinal é ligado na minha cabeça: será que uma competição em que cada vez mais as vagas são disputadas por quem paga mais pode ser considerada um esporte?

O livro citado era Manual de jornalismo esportivo (Contexto, 2006) escrito por Heródoto Barbeiro e Patrícia Rangel, que li no ano passado e fiz questão de deixar num arquivo, dentre outros, o parágrafo que traz de forma sucinta a opinião dos autores sobre o assunto:

“Por falar em tecnologia moderna, vamos nos dedicar, agora, às competições que envolvem o uso de veículos e que estão fora das Olimpíadas. A razão disso é que nem todo mundo (o COI, por exemplo), considera esses campeonatos como esporte e sim exibições de carros, motos, aviões etc. São os chamados esportes a motor, muito mais uma competição de caráter tecnológico, empresarial, uma disputa econômica do que um desafio de igualdade de condições. Não é sem razão que se qualifica de circo da Fórmula 1 as competições dessa modalidade em todo o mundo. Tal e qual um circo, há a montagem da infraestrutura, os mesmos pilotos de anos e anos se apresentam e as fábricas de carros interessadas em testar peças e componentes para serem usados nas linhas de produção de veículos brilham” (p. 102).

A Fórmula 1 atual traz ainda mais problemas para corroborar com a lista descrita acima. Primeiro, é preciso dizer que apesar das 12 equipes presentes na categoria, após uma intensa disputa há alguns anos para saber quem fecharia o pit, está longe de ter significado qualidade. Pelo contrário, não se sabe por qual motivo, continuamos a ver em 2011 "carroças" andando ao lado de carros esportivos, atrapalhando em treinos e corridas quem têm um bom ritmo. Para se ter uma ideia, a Hispania só vai apresentar o carro 2012 em março, porque não foi aprovado em dois testes de impacto a FIA.

Tudo bem, a crise econômica atrapalhou muito uma "brincadeira" tão cara como a disputa de esportes a motor, a ponto de três grandes fabricantes de carros acabarem com suas equipes: Honda, Toyota - que por muito tempo foi a que mais gastou, mais que Ferrari e McLaren - e a Renault - que cedeu aos poucos na sociedade de sua equipe, que a partir deste ano será a única Lotus no grid. E também é fato que o dinheiro faz com que para se ter uma grande chance no campeonato é preciso ter dinheiro para bons pilotos, mecânicos, engenheiros, dirigentes e peças de reposição.

Charge de Diogo Salles/Jornal da Tarde-São Paulo
Mas ver o que ocorreu com uma equipe com o histórico da Williams, que dominou a Fórmula 1 no início da década de 1990 é lastimável. Numa queda que parece nunca terminar nos últimos anos, perdeu o que era antes o seu principal patrocinador e terá em 2012 dois pilotos que pagarão para correr. O primeiro é o venezuelano Pastor Maldonado, sob a "bênção" da petrolífera PDVSA; o segundo é o já citado Bruno Senna, com alguns apoios, como da OGX - do bilionário Eike Batista - e da Gillette.

Acrescente-se a eles o bom piloto mexicano Sergio Pérez, na Sauber, que chegou à Fórmula 1 com a ajuda de um dos homens mais ricos do mundo, Carlos Slim, que com a sua Claro patrocina a equipe. Apesar disso, e é bom que se diga, o piloto é arrojado, às vezes até demais, e provou que tem potencial para seguir adiante. Só que com a falta de referências sobre o automobilismo do México, dificilmente as portas da F1 se abririam para ele.

Em 2009 escrevi um texto que tratava da "influência do dinheiro", voltado a mostrar indignação perante a determinação de horários de algumas corridas simplesmente para atender ao público de grandes emissoras de TV europeias. O caso atual me parece mais grave, pois em vez da qualidade nas categorias de base - que dependem muito do "paitrocínio" -, o que pode prevalecer cada vez mais nos próximos anos é a quantidade de patrocinadores que o piloto trará, numa reversão do que deveria ocorrer se pensarmos quem vende a força de trabalho para quem...

FALANDO EM DINHEIRO...
Só para não dizer que eu não estou acompanhando, Rubinho realizou treinos com carros da Fórmula Indy e pode mudar a tônica por lá, que sempre foi o de o piloto trazer patrocinadores para a equipe e assim garantir correr algumas corridas ou a temporada completa.

Barrichello ainda tem potencial para o automobilismo e, além disso, seria capaz de trazer a atenção para a categoria com forte traço estadunidense, cuja imagem foi fortemente abalada com a morte de Dan Wheldon na última corrida do ano passado.

Para ver a diferença que a sessão de treinos já criou, basta saber que nunca os veículos das Organizações Globo falaram tanto da Indy quanto neste início de ano. Esperemos a decisão do piloto, que ainda diz que aguarda uma vaga da F1, por mais que aparentemente não tenha sobrado nenhuma.

2 comentários:

  1. Mesmo com o advento cada vez mais presente dos patrocínios, agora até nas equipes médias, ainda continuo a considerar esporte.
    Até porque no futebol, talvez o maior exemplo de esporte que ande tão de mãos dadas com o dinheiro, os mi(bi)lionários da vez andam a cada ano adentrando o esporte comprando cada vez mais times pequenos que pouca expressão tinham em outros tempos.
    O futebol necessita, mas não tanto de dinheiro. Já a Fórmula 1 se um dia ficar cara demais pode desaparecer. Vários mercados europeus andam se fechando e vemos corridas cada vez mais nos países emergentes.

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  2. Algo importante a se saber é como definir o que é ou não esporte. Esperar o COI decidir isso acho que não é a melhor opção. Sobre a comparação com o futebol, é que este o Sobrenatural de Almeida faz muita diferença, que diga o Manchester City, que anda não conseguiu grandes resultados.

    A F1 há algum tempo vem numa onda de poupar dinheiro, como prova a grande redução em treinos. Acho que não acaba tão cedo.

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