sábado, 29 de outubro de 2011

Em busca do El Dorado - O trabalho intelectual

Nos primeiros dias por aqui no Rio Grande do Sul, um colega havia me dito que era "muito fácil" para nós termos que não trabalhar, poder ter dedicação integral aos estudos. Eu lembro que respondi que não era assim, afinal, estudar não é tão simples quanto se parece, ainda mais quando se tem "obrigações" a se cumprir, dead lines de revistas, trabalhos, qualificações e apresentações a se fazer.

É óbvio que aqui não irei comparar o trabalho intelectual com o trabalho no seu contexto original, seja em fábricas, com repetições de movimentos - como no clássico "Tempos Modernos" de Chaplin -, ou quem trabalha com plantações, com sol ou chuva, no corte da cana-de-açúcar, por exemplo.

Mas, a "efetivação" do trabalho intelectual responde às mudanças do sistema capitalista nas últimas décadas, no período de neoliberalismo, pós-modernismo e neos e pós que o pessoal gosta de inventar para parecer que tudo mudou quando a lógica continua a mesma - ganhar a mais-valia através da exploração de Outros. 

Jean-Charles Lyotard, em seu "Condição Pós-Moderna" (creio que de 1979), que poderia receber várias e várias críticas deste que vos escreve, já aponta a modificação na produção científica, que de voltada à produção do conhecimento ganha o acréscimo do processo inovador da indústria. Quer dizer, a pesquisa realizada na Academia deve se voltar à justificação de atitudes de mercado, caso do capitalismo financeiro e dos cursos de Economia dos EEUU, ou para acelerar ainda mais esta produção, no que o bom e velho Marx denominou de mais-valia relativa.

Quem participa de listas de associações de pesquisadores já deve te visto algumas discussões e recebido alguns textos criticando a fast production que os elementos de medição de produção, casos do Currículo Lattes, forçam a fazer com que as pesquisas tragam resultados o quanto antes, e que estes sejam efetivos. Trago o exemplo da questão climática, onde se descobriu que pesquisadores estadunidenses maquilavam resultados para manter os recursos na pesquisa. Coisas assim vão além de questões morais e éticas, termos também discutíveis, mas engendram-se no cerne da forma atual da sociedade.

Viagens, artigos, aulas,... e problemas
Tudo isso para falar de uma situação particular. Venho de um período muito cheio de atividades. Tudo bem que é "culpa" minha. Sabia que o ritmo aqui seria intenso e gosto de fazer muitas coisas, ainda mais quando as possibilidades vêm até mim, não preciso correr atrás delas. Mas, em compensação, se não tiver cuidado você não faz mais nada.

Ao contrário do trabalho em empresas, a função do pesquisador é pior num aspecto. Se quando você sai da sua empresa, com exceção dos que trabalham em casa ou são workaholic, o trabalho termina ali, para quem trabalha só no aspecto intelectual a tua pesquisa te segue aonde for, sendo que se trabalha mais em casa que nos ambientes universitários.

Só nesta semana tive que terminar uma versão da qualificação, um artigo, viajar para uma cidade do interior, fazer participação em rádio, debater sobre alterações na TV e no dia seguinte acordar bem cedo a tempo de realizar outras atividades e, ainda assim, não poder perder tempo no ônibus dormindo porque tinha coisas a ler.

Como já disse, faço tudo isso porque eu quero, provavelmente meus colegas de Pós-graduação não se intrometam com metade dessas coisas, mas é um exemplo de como o trabalho intelectual é uma categoria válida, ainda mais para quem pretende fazer uma pesquisa que rompa as barreiras da Academia. Para mim, que tenho opção de estudar e pesquisar de forma não rasa sobre algumas coisas, é essencial dar o retorno à sociedade sobre o que produzo. Não só porque é uma bolsa federal que me banca aqui, mas porque é a função da Universidade, produzir, repassar e discutir este conhecimento produzido com quem também vive essa mesma realidade que estudamos.

Como forma de desabafo
Às vezes me deparo com discussões e problemas fúteis até. Pessoas que confundem uma das minhas posições sociais, a de membro de um grupo de pesquisas, por exemplo, com o que acredito e/ou com o que faço. Sempre procurei não ligar a minha vida pessoal à minha vida profissional/escolar, por mais que os meus amigos sejam das relações de trabalho/estudo, isso é uma forma de poder diferenciar as coisas. Por isso que poucos sabem das minhas relações pessoais com quem quer que seja, não gosto de falar sobre e ponto final. Sei que os meus problemas numa das áreas não deve interferir na outra - por mais que a falta de tempo possa servir como contraponto a esta ideia.

Meus blogs particulares, que agora se restringem ao Dialética, e meu perfil no Twitter são minhas formas de escapar dessa relação de obrigação. Significa escrever sobre o que eu quiser, sendo os méritos ou equívocos cometidos sendo de total responsabilidade minha. Estando eu, consequentemente, pronto para agradecer os elogios ou me desculpar caso acredite que alguma crítica foi indevida. São espaços meus e, óbvio, de responsabilidade minha.

Não é a toa que mesmo nos espaços que tenho em outros sítios, casos do Sururu Fresco e do Estratégia & Análise, tenho todo o cuidado desse mundo. Por maior liberdade que tenha, não posso escrever o que vier à cabeça por lá, pois tem outras pessoas envolvidas e que são responsáveis pelo espaço como um todo.

Quase oito meses aqui e a adaptação ao tempo meteorológico (também) continua dificultando a vida. Dias que começam a 16º e terminam a 28º ou mais de 30º. Este é o Sul do país...

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