segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O país, além do óbvio

Na última sexta-feira (04), o Centro Cultural Sesi encerrava a sua III Mostra de Cinema Brasileiro, cujo tema deste ano foi “O país, além do óbvio”. E para falar sobre as agruras do Brasil que ultrapassem o carnaval, a mulata e o futebol nada melhor que encerrar com um filme histórico baseado num dos grandes livros da literatura brasileira.

O clássico São Bernardo, dirigido por Leon Hirszman em 1972, foi restaurado com o apoio da Petrobras, assim como todo o acervo do diretor, e reapresentado ao público no Festival de Brasília do ano passado.

Baseado na obra homônima de Graciliano Ramos, cuja uma das grandes características era a objetividade no descrever cenas e ações, o filme foi gravado tendo como roteiro o livro para, assim, ser o mais fiel possível na transcrição – uma das grandes dificuldades do cinema.

E como o foi! Por mais que um ritmo graciliânico dê uma visão de agilidade na tela, o filme pode ser facilmente acompanhado mesmo por quem nunca leu o livro.

Mas, quem já teve o prazer de ler obras do "Mestre Graça" sabe o quanto o autor foi capaz de demonstrar os problemas de sua região sem precisar trazer à tona as suas opções políticas. Em São Bernardo vemos as dificuldades de um sertanejo que acaba por se tornar um avarento dono de propriedade, a quem os empregados não passam, a seu ver, de tentativas frustradas de seres humanos.

Muito bem representado por Othon Bastos, que recebeu o candango do Festival de Brasília de 1973 como melhor ator , Paulo Honório narra a sua vida para o público de uma forma a passar os cacoetes de um sujeito que aprendeu tarde a reconhecer o lado emocional característico do homem.

O curioso é que o público presente no Cine Sesi Pajuçara na noite da sexta achava graça de algumas ações mesquinhas do protagonista, por mais que demonstrassem o quanto o dinheiro dominava a vida do sujeito. As ações visavam o lucro e o desenvolvimento individual futuros.

Já a interpretação de Madalena, que também deu a Isabel Ribeiro um candango em 1973, deu à personagem um caráter inocente, e até mesmo bestial, no início do seu relacionamento com Paulo Honório. Prova disso é a cena de quando ela aceitou casar com o latifundiário e sua troca de olhares com ele – que foi uma das fontes de riso da plateia.

Só que Madalena cresceu ao longo do filme, ao se intrometer nas conversas com o padre, Godin, Ribeiro e Padilha sobre a possibilidade de uma revolução para melhorar a vida das pessoas, além do seu cuidado e da sua atenção com todos, mesmo os empregados. O seu marido via crescer o ciúme da mulher e a raiva por ela incitar os seus trabalhadores.

E é no final que os dois personagens chegam ao ápice e os atores ao primor da atuação. Quando finalmente o casal consegue conversar sobre seus problemas e Madalena conta como foi difícil a sua formação escolar, onde economizava até na quantidade de folhas. O passado de pobreza era o mesmo para os dois.

Destaque também para a fotografia do filme, sob responsabilidade de Lauro Escorel. Grandes imagens são trazidas em cada cena, que busca reproduzir a cidade alagoana de Viçosa.

Pudemos comprovar aqui em Alagoas, através da III Mostra do Cinema Brasileiro, todas as qualidades faladas e escritas sobre esta produção cinematográfica. Um dos clássicos da literatura brasileira virou um dos clássicos do cinema nacional. Realmente, o país além do óbvio de filmes com atores, diretores e roteiros de novela.

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